«Um dos meus primeiros palcos foi o fogo de conselho»

Jorge Mourato é um ator bem conhecido por todos, mas o que muitos desconhecem é que foi o Escutismo que contribuiu para criar as bases da sua criatividade. Foi no Agr. 36 da Marinha Grande que conheceu a importância que o Escutismo tem na sociedade atual. Fala do Escutismo com muita facilidade e explica como o movimento o ajudou no seu percurso profissional. 

Como foi o seu percurso no Escutismo?

JM: Lembro-me de que pedi aos meus pais, era muito pequeno, e na Marinha Grande devo ter visto ou alguma cerimónia ou na Igreja, e disse aos meus pais que gostava muito de ir para lá. Lembro-me de ir com o meu pai à sede do Agrupamento 36, devia ter quatro ou cinco anos, ainda não podia ser Lobito… Então, depois, mais tarde, é que ingressei no agrupamento, na idade normal dos Lobitos, seis anos.

Quanto tempo é que ficou no agrupamento?

Até aos 16 ou 17 anos. Ainda fui Caminheiro. Pouco antes de ir para Lisboa, já tinha saído dos escuteiros, lembro-me de ainda ter ido a um acampamento nacional, na Praia da Tocha, e a partir daí foi quando eu saí.

Sente que o Escutismo teve um papel importante na sua vida? 

Sim, ainda hoje a vir para aqui estava a pensar… Porque a nossa vida é um percurso, não há caminho, o caminho faz-se andando, e muitas das coisas em que eu me envolvi no meu percurso de vida foram complementares para a minha vida profissional também. Tenho 0% de dúvida de que os fogos de conselho me desinibiram e estimularam a minha criatividade para o meu percurso artístico. Um dos meus primeiros palcos foi o fogo de conselho… Tanto a parte cómica como a parte mais séria, mais dramática, foram instrumentos importantes para isso, o trabalho em equipa… Enfim, foi uma ferramenta que me ajudou tanto a ser pai, como profissional, como estudante… Uma ferramenta importantíssima.

Sente que na altura em que participava nos fogos conselhos já estava a dar os primeiros passos na sua vida artística?

Já. Já estava muito à vontade. Não quero parecer presunçoso, mas já era a atração principal da equipa [risos] «Então e o número cómico?» «Vai o Jorge!» 

Que cargos desempenhou com mais frequência?

Sempre fui Chefe de Equipa… Fui Chefe de Equipa nos juniores, depois nos seniores… Alternava. Era Secretário, era Cozinheiro… Não tínhamos cargos fixos. Tenho essa noção que rodávamos.

No seu dia a dia, as escolhas que faz são influenciadas pelo seu percurso no Escutismo, ou não? 

Para saber gerir equipas, gerir família, gerir crise de ansiedade. Disciplina também. Planificação…

Tem algumas boas memórias de alguma atividade ou acampamento?

Tenho muitas! Boas e más. Mas tenho muitas boas memórias! Da primeira vez que vamos para fora, enquanto Lobitos, faz-se um acantonamento aqui. Depois, o primeiro acampamento deu-me um alento enquanto criança de mostrar a mim próprio que podia ser independente dos meus pais. Depois, a primeira vez que vamos para um acampamento nacional com tanta gente! No meu segundo acampamento nacional fizemos uma geminação com um agrupamento alemão e fizemos amigos alemães, aí a parte internacional.

Nunca fez uma atividade internacional?

Não. Fizeram no Agrupamento 36, mas eu saí entretanto, foi na Alemanha.

Se tivesse de dar um conselho aos jovens escuteiros que estão agora a dar os primeiros passos no percurso profissional, que conselho daria?

Acho que manter as expectativas não muito em baixo, mas q.b., e pensar que amanhã é outro dia. Amanhã há outras coisas para fazer, pode não correr tão bem… Fazermos o nosso próprio fogo de conselho, acho que é o que eu queria aconselhar. Ao final do dia fazermos o nosso fogo de conselho, refletirmos um bocado e animar-nos um bocado. Pensar no nosso dia, pensar no que é que aconteceu de bom, o que é que aconteceu de menos bom, tirarmos as elações daí, e amanhã o Sol vai nascer outra vez e as coisas que correram menos bem vão correr melhor e as que correram melhor vão correr ainda melhor.

Em relação ao CNE, que comemora 100 anos no próximo ano, qual é a sua opinião sobre a associação e sobre o papel que desempenha na sociedade?

 Já não acompanho o CNE há uns bons anos, mas sei que é uma associação importante para o desenvolvimento dos jovens em Portugal.

Tem um papel muito importante na formação dos jovens: a componente católica pode atrair mais pessoas ou então não atrair tantas, como a outra associação, a AEP. A parte católica é sempre questionável, mas tem valores que são intrínsecos à Humanidade… A solidariedade, a amizade, a entrega e a partilha ao outro, acho que são fundamentais para criarmos bons cidadãos e acho que é o que este mundo está a precisar…. De pessoas que em vez de estarem a olhar para o ecrã de um telemóvel que olhem para o outro. Ajudarmos os outros, sabermos qual é o nosso papel na sociedade e tentarmos melhorar isto um bocado. Eu vejo cada selvajaria hoje em dia que é… As pessoas estão muito dispersas e fechadas. A pandemia também não veio ajudar, mas acho que hoje em dia as pessoas estão muito egoístas. Montamos a nossa tenda, mas não pensamos no “resto do campo”. O CNE tem aqui um papel muito importante, enquanto associação que forma jovens.

Também dou destaque à formação dos Dirigentes e dos Chefes de Unidade, a formação também é importante para eles. E estarmos atualizados, mas atualizados aos dias de hoje, aos mais jovens. Os valores deveriam ser os mesmos, mas os jovens de há 30 anos não são os jovens de agora. São muito mais abertos, sabem muito mais coisas, tanto para o bem como para o mal. Há que estar atento, mas, como os meus pais me ensinaram, liberdade com responsabilidade. 

Entrevista: Cláudia Xavier

Fotografias: Cláudia Xavier, Arquivo CNE e Agr. 36

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