O Documento Final do Sínodo dos Jovens dedicado ao tema «Os jovens, a fé e o discernimento vocacional» foi aprovado pelos 249 participantes que votaram o documento na aula sinodal.

Com 12 capítulos, 167 parágrafos e 60 páginas, dividido em três partes, o documento vai beber a forma do Instrumentum laboris, o que traduz desde logo uma vontade dos padres sinodais em seguir de acordo com os caminhos apontados pelo documento de trabalho sinodal, que já tinha sido baseado nos contributos que os jovens deram no pré-sínodo e no questionário online que estiveram na base da elaboração do documento.

Em causa, realçam os padres sinodais, está a necessidade de preparar adequadamente «leigos, homens e mulheres, capazes de acompanhar as jovens gerações», que, perante fenómenos como a globalização e a secularização, se movem numa direção de «redescoberta de Deus e da espiritualidade».

O ponto 3 do documento aponta para uma «fase de aplicação», o que vai no sentido do Motu Proprio do Papa sobre o Sínodo, publicado pouco tempo antes de esta reunião ter tido início, e que indica a criação de um momento pós-sínodo, do qual ainda nada se sabe.
Houve quem falasse também na necessidade de realizar sínodos locais, nas dioceses, reunindo a juventude, os agentes pastorais e o clero, mas não saíram indicações precisas sobre o que poderá ser feito em cada local.

Um dos pontos mais falados durante o Sínodo foi a importância do acolhimento dos jovens na Igreja. Neste aspecto, o escutismo pode desempenhar um papel importantíssimo, pois muitos dos seus elementos conhecem a Igreja a partir do escutismo, como foi o exemplo da escuteira da Guiné que deu o seu testemunho de conversão do islão ao catolicismo por causa do escutismo católico.

Pontos mais controversos foram a homossexualidade, a sinodalidade e a representatividade dos jovens
O documento foi aprovado na totalidade, ao contrário do que aconteceu no último sínodo sobre a família, em que alguns pontos foram rejeitados, mas publicados na mesma, por indicação do Papa Francisco. Neste caso, todos foram aprovados, embora, em alguns pontos, a maioria de 2/3 necessária para o aprovar ter sido quase colocada em causa. Entre os que provocaram mais polémica, está o ponto onde se refere a relação da Igreja com as pessoas homossexuais, que teve mais 20% de votos contra.

Havia muita pressão para o Documento final referir o termo LGBT, como dizia no Instrumentum laboris, mas tal não aconteceu. No entanto, o termo «tendências sexuais» com que habitualmente a Igreja se referia a estas pessoas foi substituído no documento pelo termo «inclinações sexuais», conforme diz o ponto 150 do documento, aquele que teve maior oposição, com 65 votos contra. «Neste ponto, o Sínodo reafirma que Deus ama todas as pessoas e assim faz a Igreja, renovando o seu empenho contra qualquer discriminação e violência de base sexual», diz o documento, que acrescenta que «reafirma a determinante relevância antropológica da diferença e reciprocidade entre o homem e a mulher e considera redutor definir a identidade da pessoa a partir unicamente da sua “orientação sexual”».

Um dos blocos que teve mais votos contra, na casa dos 15%, foi o capítulo que diz respeito à sinodalidade da Igreja, o que não deixa de ser curioso, pois foi um dos pontos mais falados e abordados por todos os participantes nestes dias. Neste campo, o documento sugere, no seu ponto 123, que os jovens tomem parte dos processos de decisão da Igreja nos vários níveis, naquele que é um dos objetivos mais práticos de aplicação em todo o documento. «O Sínodo pede para que se torne efetiva e ordinária a participação ativa de jovens nos lugares de corresponsabilidade das Igrejas particulares, bem como nos organismos das Conferências Episcopais e da Igreja universal. Pede também que se reforcem as atividades da secretaria juvenil no Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, através da criação de um organismo de representação dos jovens a nível internacional», indo ao encontro da proposta que saiu do círculo menor de língua portuguesa.
Este é um ponto que também tem estado em discussão no CNE, o da representatividade dos jovens, que ganha um novo impulso e reforço com este Documento.

Reconhecer o impacto dos abusos
Na primeira parte, o documento mostra o «reconhecimento» que os padres sinodais fazem do «contexto em que os jovens estão inseridos». No ponto 7, os padres sinodais reconhecem que os jovens querem ser «acolhidos, reconhecidos e acompanhados». Reconhecendo que «não faltam iniciativas e experiências onde os jovens podem ser acolhidos», o documento também reconhece que «às vezes prevalece a tendência de fornecer respostas feitas e receitas prontas, sem deixar que as questões dos jovens surjam com a sua novidade e provocação».

O capítulo fala de «três desafios cruciais»: «a novidade do ambiente digital», que representa «uma extraordinária oportunidade de diálogo, encontro e partilha entre as pessoas»; «os migrantes como paradigma do nosso tempo», uma realidade que «suscita alarme e medo, muitas vezes fomentados e explorados para fins políticos. Difunde-se uma mentalidade xenófoba, de isolamento sobre si próprio, o qual é preciso reagir com decisão»; e o «reconhecer e reagir a todo o tipo de abuso», onde os padres sinodais elogiam «quem tem a coragem de denunciar o mal sofrido».

A questão dos abusos está, aliás, bem vincada no documento, que elenca «abusos de poder, económicos, de consciência e sexuais». O assunto foi estando presente ao longo dos dias nas conferências de imprensa com os participantes, principalmente na necessidade de admitir o problema para que ele não se volte a repetir. O texto realça a necessidade de «reagir a todos os tipos de abuso» e «pedir perdão» pelo sofrimento causado por «alguns bispos, sacerdotes, religiosos e leigos» nas vítimas, entre elas muitos jovens.

Dedicar bens e recursos da Igreja à pastoral juvenil
No segundo capítulo, o Documento é mais «interpretativo» e oferece algumas «chaves de leitura fundamentais sobre os temas sinodais». Os padres sinodais falam de um «novo Pentecostes» e de um «espírito que rejuvenesce a Igreja».

Aqui, destaca-se a figura do acompanhante, um perfil que foi muito falado na aula sinodal. «Uma autêntica missão, que requer disponibilidade apostólica de quem a cumpre», refere o ponto 101 do documento, uma missão que se reflete diretamente no papel do dirigente no escutismo.

Para realizar este serviço, diz o documento, aquele que acompanha «precisará de cultivar a sua vida espiritual, alimentando o relacionamento que o liga àquele que lhe atribuiu a missão. Ao mesmo tempo, precisará de sentir o apoio da comunidade eclesial a que pertence. Será importante que receba formação específica para esse ministério em particular e que também possa ele próprio beneficiar de acompanhamento e supervisão», referem os padres sinodais no ponto 103.

Na terceira parte, o documento recolhe «as escolhas para uma conversão espiritual, pastoral e missionária».

Além da parte dedicada à sinodalidade, que já abordámos acima, o documento fala na necessidade de repensar a paróquia, «numa lógica de corresponsabilidade eclesial e de zelo missionário, desenvolvendo sinergias no território. Só assim pode aparecer um ambiente significativo que intercepta a vida dos jovens», pode ler-se no documento, que deixa o aviso. «Uma visão da ação paroquial delimitada apenas por fronteiras territoriais e incapaz de interpelar com propostas diversificadas os fiéis e, em particular, os jovens, aprisionariam a paróquia numa imobilidade inaceitável e numa preocupante repetição pastoral», consideram.

Sobre a pastoral vocacional e juvenil, o Sínodo «avança com a proposta da elaboração, ao nível das Conferências Episcopais nacionais um “Diretório de Pastoral Juvenil” em chave vocacional que possa ajudar os responsáveis diocesanos e agentes locais a melhorarem a formação com e para os jovens».

O desafio do digital tem a marca dos jovens
A questão da comunicação digital foi das que mais foi referida como essencial no que toca ao permitir o maior protagonismo desejado pelos jovens na Igreja. Reconhecendo que nestas matérias os jovens «estão à frente dos pastores», o documento final aponta para a necessidade «aprofundar o conhecimento da sua dinâmica e do seu alcance do ponto de vista antropológico e ético», para promover o seu «potencial comunicativo em vista do anúncio cristão».

Para isto, «os jovens cristãos, nativos digitais como os seus pares, encontram aqui uma missão autêntica, na qual alguns já estão empenhados. São os próprios jovens que pedem para ser acompanhados num discernimento sobre os modos de vida maduros em um ambiente fortemente digitalizado que permite aproveitar as oportunidades, evitando os riscos».

O Sínodo espera que na Igreja se «estabeleçam escritórios ou órgãos apropriados para a cultura e a evangelização digital nos níveis apropriados, que, com a contribuição indispensável dos jovens, promovam a ação e reflexão eclesial neste ambiente». Os padres sinodais sugerem ainda que, «além de promover o intercâmbio e a disseminação de boas práticas ao nível pessoal e comunitário, e desenvolver ferramentas adequadas para a educação e evangelização digital», estes departamentos possam originar protocolos «de certificação de sites católicos, para conter a disseminação de notícias falsas em relação à Igreja, procurando maneiras de persuadir as autoridades públicas a promover políticas e ferramentas cada vez mais rigorosas para a proteção de menores na web».

A realidade dos migrantes, «paradigma do nosso tempo»
O documento sinodal concentra-se também no tema dos migrantes, «paradigma do nosso tempo», como um fenómeno estrutural, e não uma emergência transitória. Muitos migrantes são jovens ou menores desacompanhados, que fogem da guerra, violências, perseguição política ou religiosa, desastres naturais, pobreza e que acabam vítimas de tráfico, drogas, abusos psicológicos e físicos.

Ressoam, portanto, os verbos sinodais «acolher, proteger, promover, integrar» indicados pelo Papa Francisco para uma cultura que «supere a desconfiança e o medo». Os bispos também pedem mais empenho em garantir àqueles que não desejam migrar o direito de permanecerem no seu próprio país. A atenção do Sínodo também se dirige àquelas Igrejas ameaçadas em sua existência, pela emigração forçada e pelas perseguições sofridas pelos fiéis.

O documento final, apresentado este sábado no Vaticano, presta homenagem aos jovens que, por causa da sua fé, sofrem «vários tipos de perseguição, mesmo até à morte».

O documento foi entregue ao Papa Francisco. Na missa conclusiva que teve lugar domingo, foi lida a carta que os participantes prepararam, dirigida aos jovens de todo o mundo. Se o Papa decide tornar este documento o resultado oficial do Sínodo ou se irá ele próprio elaborar algum documento só saberemos mais para a frente.

Texto e fotografia de: Ricardo Perna.

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