CNE participa no The Academy 2024 em Cracóvia
Dois Dirigentes do CNE marcaram presença na edição deste ano do The Academy, um evento europeu de formação para escuteiros e guias, que se realizou entre 22 e 27 de novembro em Cracóvia, na Polónia.
A No Bully Portugal é uma associação sem fins lucrativos, fundada em 2016 para prevenir, parar e resolver o bullying e cyberbullying. Através da formação e ações de sensibilização fazem a diferença na vida de crianças e jovens que passam a acreditar que a empatia e a bondade são dois fatores essenciais para uma sociedade sem bullying. Fomos conhecer a Inês Andrade, presidente e co-fundadora da No Bully Portugal e que nos contou um pouco mais sobre este projeto social.
Flor de Lis (FL) – Como surge a ideia de criar a No Bully Portugal?
Inês Andrade (IA) – Vai fazer agora 7 anos que em conjunto com outras pessoas, inclusive com a minha mãe, que é a vice-presidente da associação, pensámos em começar um projeto social. O bullying era um tema que nos era próximo, pelo menos a mim porque tinha passado por isso e tinha estado envolvida nesse tipo de problemas, sem saber na altura como lidar. A minha mãe trabalha muito com formação de adultos e o que ela sentia é que começar cedo a falar sobre emoções, relações e empatia é sempre melhor do que trabalhar estes assuntos quando já somos adultos. Descobrimos um projeto que tinha o mesmo nome, a funcionar nos Estados Unidos e que já tinha um programa muito bem estruturado para lidar com o bullying no contexto escolar, que era muito focado na empatia, na colaboração e também nos métodos de coaching. Eram tudo coisas com que nós nos identificávamos e que achávamos que poderiam ser uma mais-valia em Portugal, porque do nosso conhecimento a nível nacional não havia nada assim que estivesse a ser implementado e que pudesse ajudar realmente os jovens, as famílias e as pessoas que trabalham na escola, a lidarem melhor com o bullying. Então foi desde aí que trouxemos esse programa para cá e desde então tem estado a ser implementado em várias escolas.
FL – Como é que tem corrido o projeto? Qual é o feedback das escolas?
IA – No início com alguma resistência, mas acho que cada vez melhor. Não existiam projetos destes em Portugal e tivemos alguma dificuldade em ter escolas interessadas, mas agora que já estamos cá há 7 anos, que as pessoas nos vão conhecendo e ouvindo falar, já são as escolas que nos procuram. No início éramos nós. Por isso, já é bastante diferente… Agora até temos escolas a mais para aquilo que conseguimos dar resposta.
FL – Existe alguma resistência para falar sobre o bullying ou estamos cada vez mais abertos a falar sobre ele?
IA – Sim, no geral já se fala muito. Vê-se muito nos media, é um tema relativamente comum de se falar. Acho que o tipo de conteúdo ainda é um pouco centrado na vítima, no “coitadinho”, um tipo de história bom versus mau. Ou seja, não se fala de uma forma construtiva e focada em soluções. Nem sempre as crianças estão à vontade para falar sobre isso, mas depende sempre da idade, porque geralmente quando são mais pequenos estão mais à vontade para dizerem o que se passa. Os adolescentes já se escondem mais, estão preocupados com o que os outros vão dizer e às vezes só em privado é que partilham alguma coisa. Continua a ser um tabu uma pessoa assumir que está a ser alvo de bullying ou que está a fazer bullying, porque parece que há algo de errado consigo e não deveria estar a acontecer. Então as crianças e os jovens não falam disso abertamente, e mesmo pessoas adultas que conheço que passaram por situações de bullying têm dificuldade em falar sobre o assunto.
FL – Acaba por deixar marcas no futuro, não é isso?
IA – Muitas vezes. E as pessoas podem não conseguir lidar muito bem com esse trauma.
FL – Conseguiria identificar qual a idade de crianças e jovens que recorrem mais à No Bully Portugal?
IA – Quem recorre normalmente são pais e mães com filhos a partir dos 5 aos 12 anos. Normalmente são situações de violência física que estão a decorrer na escola e que não há ação por parte da escola e os pais estão muito preocupados. O que não quer dizer que seja onde existam mais casos, mas que recorrem mais a nós porque os pais estão mais em cima do acontecimento e estão preocupados por eles serem pequeninos. Os adolescentes já não temos tantos contactos porque se calhar eles próprios não estão muito à vontade para falar sobre isso, nem connosco nem com os pais.
FL – Os pais de adolescente não conseguem identificar tão facilmente a situação…
IA – Sim, porque devem achar que é normal os adolescentes ficarem mais isolados, quererem ir para o quarto sozinhos, porque é normal da idade. Querem ser mais independentes e não partilham tudo com os pais. Depois há de facto problemas que estão a acontecer e que os pais não têm noção porque não têm essa facilidade de comunicação com o adolescente.
FL – Num caso prático, consegue dizer-me como é que se desenvolve o vosso apoio?
IA – O nosso trabalho nem é tanto no apoio aos alvos, é mais na formação, mas também damos esse apoio pontualmente. O que nós fazemos é um apoio de aconselhamento e apoio emocional para a família. O que nós tentamos fazer é que haja alguém que oiça as famílias que estão a passar por isso. Os pais que nos contactam estão muito preocupados, porque se sentem pouco ouvidos e que a situação está a ser desvalorizada na escola e outras entidades a quem recorrem. Nós acabamos por ser quem os ouve, tentamos perceber a situação e dizer-lhes as possibilidades que eles têm.
FL – Nas vossas formações, quais são as ferramentas que passam às famílias e às escolas para que este problema seja resolvido?
IA – Trabalhamos com a escola pelo menos um ano letivo e damos formação para o pessoal docente, não docente, encarregados de educação e temos também várias atividades para os jovens. A formação é gratuita para escolas públicas, temos patrocinadores que apoiam essa formação. O nosso programa é baseado na empatia, chama-se escola com empatia, e em vez das típicas formas de resolver, com o sermão, eventualmente suspensões, utilizamos uma metodologia criada nos Estados Unidos para de certa forma motivar os jovens que estão a fazer bullying, e outros jovens que estão também envolvidos na situação, mas que querem pará-la, motivá-los a ajudar o alvo, ou seja a vítima, e a recebê-lo, a apoiá-lo para que ele se sinta bem de novo no grupo.
FL – Para que o alvo não se sinta tão sozinho, não esteja isolado, é isso?
IA – Sim, e mesmo que os bullies possam perceber o impacto que estão a ter no colega, que muitas vezes podem saber que estão a fazer mal, mas não percebem o impacto real que aquilo tem na vida dele. Para eles é uma brincadeira de mau gosto, para o alvo pode ser mesmo uma coisa muito difícil. Ao compreenderem isso, e a ser-lhes dada a oportunidade de com os colegas mudar essa situação e melhorar essa situação, a grande maioria dos jovens colabora bastante bem e muda a sua atitude, desde não fazer nada até proteger o alvo e ser o protetor e amigo dele. Essencialmente pararam de fazer o bullying.
FL- Eles param de fazer o bullying porque passam a ter consciência da forma como as suas ações estavam a impactar no seu alvo?
IA – Acredito que sim. Porque o bullying pode ser feito com mais ou menos consciência, mas nenhuma noção da realidade do outro. É muito centrado nas necessidades da pessoa que faz o bullying, que quer protagonismo, a atenção dos colegas, quer impor-se. Quando percebe que há ali outra pessoa que está a sofrer, que tem sentimentos, vai para casa a pensar nisto, que fica magoado e não quer ir para a escola e tudo isso… Se isto for feito no ambiente certo, resulta. Sei que há pessoas nas escolas que forçam essa empatia “Não vês? Como é que é possível? E se fosses tu?”. Em modo raspanete em que dificilmente entra alguma coisa, porque estão a defender-se, “Mas não fui eu, ele é que teve culpa”. Não somos nós que fazemos este processo, são os próprios professores ou psicólogos da escola, mas ensinamos este método que cria um ambiente de segurança, que não é para ser um ambiente de repreensão, nem um castigo, é uma conversa em que se quer é pensar no futuro e no que eles já fizeram. Pensar como é que no futuro podemos estar aqui todos bem, estarmos todos a sentirmo-nos saudáveis e a darmo-nos bem uns com os outros. São tratados por igual, não são atacados, são muito mais colaborativos e acabam por ser levados e a aceitar ajudar ou parar de fazer o bullying.
FL – E no caso do cyberbullying acredito que seja mais difícil de identificar ou até arranjar uma solução. Quais são as vossas ferramentas para isso?
IA – A parte da identificação é mesmo só através da denúncia e também da monitorização por parte dos pais, mas eu sei que muitos pais não fazem essa monitorização, também depende da idade. Nós transmitimos aos pais que quando eles dão um smartphone a uma criança ou um tablet ou o que seja têm que a ensinar a utilizá-lo de uma forma responsável e isto pode durar alguns anos até eles saberem como o fazer e poderem estar 100% autónomos. Não dizemos esta ou aquela idade, mas para os pais estarem atentos e perceberem o que é que a criança está a fazer. Existem apps para controlar, ou podem utilizá-los só ao lado dos pais, ou estabelecer algumas regras de forma transparente. Não se trata de espiar, mas de forma transparente verem as mensagens, saberem com quem é que eles falam. Na pré-adolescência é quando começam este tipo de problemas. Normalmente começam a utilizar smartphone no 5º ano, têm WhatsApp e criam redes sociais. As redes sociais são só a partir dos 13 anos, mas muitos têm a partir dos 10 ou 11 anos, e o que nós dizemos é que por alguma razão é a partir dos 13, por isso se calhar é melhor cumprir”. Por isso é necessária essa prevenção e monitorização, mas claro que pode sempre acontecer e os pais não perceberem, porque é muito difícil controlar a 100%. Em casos de bullying e cyberbullying a polícia pode ser sempre envolvida, mas primeiramente deve começar a falar-se com a escola, deve ser a escola a resolver a situação, mas dependendo da gravidade, deve envolver-se a polícia. A polícia tem equipas especialistas nessa área consoante a seriedade das questões. Depois é a questão de chamarem nomes uns aos outros, excluírem-se dos grupos uns dos outros, agora já não fazem parte… São aquelas quezílias que eles têm que podem ser bullying ou ser um simples conflito. Nós também costumamos distinguir esses dois conceitos para os pais também conseguirem perceber que nem tudo será bullying. As escolas queixam-se muito que os pais acham que tudo é bullying e os pais queixam-se que a escola não faz nada. Ou seja, eu estou sempre a ouvir os dois lados.
FL – É difícil mediar essa situação.
Pois, normalmente eu só falo com um lado de cada situação. Porque se vem dos pais a escola não quer falar connosco e se vem da escola os pais nem sempre querem falar connosco. Por isso, é sempre aqui uma “guerrinha” entre os dois lados. São sempre duas perspetivas diferentes, porque os pais não estão dentro da escola, só ouvem o que a criança conta, quem está na escola só vê o que vê e depois nem sempre vê tudo, então é um bocadinho complicado. Mas sim, em relação ao cyberbullying também há a questão de “o que é que a criança faz?”, a reação que ela tem em relação aos colegas. Porque no cyberbullying a melhor reação é sempre não responder.
FL – A reação mais comum é não responder?
IA – Não tenho dados para isso, mas acredito que não. Mesmo nos adultos, quem nos provoca online nós temos tendência para responder, não é? As crianças com a sua impulsividade natural com certeza que dirão coisas que depois se podem virar contra elas. O que nós dizemos é sempre: Se eu insultar alguém cara a cara ela vai ver a minha reação, há sempre uma reação mesmo que não seja real. Por isso, online eles não estão a ver a minha cara, eu até posso ficar com a raiva toda ou chorar, mas eles não sabem. O melhor é mesmo nada, porque a não resposta é sempre neutra e se nós respondemos, e eu própria sofri de cyberbullying quando era miúda, só vamos piorar porque qualquer resposta será problemática para nós.
FL – Então diria que o primeiro passo seria então ignorar e a seguir? O passo seguinte seria contar aos pais?
IA – Sim, pode ser simultâneo. Não gosto muito do termo ignorar porque pode ser um pouco enganador. Os pais e os professores, em geral, dizem muito aos miúdos “ignora”, “não ligues” … Mas quando nos estão a chatear constantemente não dá para ignorar. Acho que ninguém é de ferro, por isso normalmente eu não digo “ignora” digo “não respondas”, que é diferente. Eu recebi aquela informação, mas não vou dar uma resposta de volta. E em seguida falar de preferência com os pais. Nem toda a gente tem uma relação próxima com os pais, mas esse será o caminho normal. Devem com os professores, seja o jovem, sejam os pais, mas infelizmente o bullying depende sempre muito da boa vontade das pessoas. Isto talvez não seja tão bom escrever, mas é um pouco da realidade: Se apanhamos um professor muito preocupado faz trinta por uma linha para resolver a situação, se for um professor mais displicente não faz nada… Normalmente as escolas não têm ainda um procedimento muito claro, ainda há muitas escolas que nunca tiveram formação, nós estamos sempre a trabalhar com escolas novas e perguntamos e eles dizem que nunca tiveram qualquer tipo de formação, por isso eles não sabem como é o procedimento, cada professor faz como acha.
FL – Parte da iniciativa de cada um…
IA – Sim, e as pessoas muitas vezes estão cansadas, estão desgastadas. Não querem mais chatices e acabam por ignorar esse tipo de problemas. Por isso, vamos primeiro ao professor responsável se o professor não fizer a sua parte vai-se à direção ou a outro alguém dentro da escola. Tentamos sempre recorrer aos meios todos dentro da escola, se a escola realmente não quiser apoiar aí vai-se à polícia, também há as comissões de proteção de crianças e jovens, e em última instância também se pode contactar a direção geral dos estabelecimentos escolares, que também é responsável pela questão do bullying.
FL – Por ter sofrido bullying nota que essa experiência a influenciou nos conselhos que consegue dar aos pais e educadores?
IA – Sim, acho que consigo ter mais empatia pelos jovens, porque não é só uma coisa teórica que se aprende, mas consigo colocar-me no lugar deles e perceber o que é que eles estão a sentir. Claro que cada pessoa é diferente, mas acho que ajuda um pouco e também a motivação para continuar a ajudar estas pessoas vem de ter tido essa experiência e saber que é complicado estar nela.
Sabe mais sobre a No Bully Portugal carrega neste link.
Texto: Cláudia Xavier
Fotografias: No Bully Portugal
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